Se bem
me lembro, tudo terá começado num comboio oriundo do Barreiro, quando
regressava de férias... umas férias solitariamente desfrutadas na companhia de
meus pais entre a límpida linha do meu azul horizonte e o poluído azul do
horizonte da Linha[2]… Parede...
Carcavelos... Cascais[3]... vagos portos
do meu infantil-mar, cujo quartel geral se situava algures numa velha casa de aspeto
ruinoso situada no Alto de S. João, mais precisamente na Quinta dos Peixinhos
(a casa dos meus tios!) -quando meus pais encontram uns amigos de sua infância.
Os pais do meu, então, inocente, Primeiro Amor...
As
remotas referências que agora poderão aflorar pecariam por intemporalidade...
parte delas perderam-se no seio do Diário I -um pequeno bloco de notas por mim
próprio mal encadernado, que morreria às mãos da minha vergonha (queimara-o por
considerar não possuir grande valor literário). Adorava-o por ser o meu
primeiro Diário... e só mais tarde descobri que, afinal, quem ficara mais pobre
fora eu...
(Diário)
«Encontrei-te
naquele distante-comboio-de-infância; recordas?
O teu
cabelo curto, coberto por um boné de pala, a roupa diferente do habitual,
transformava-te no companheiro de brincadeira ideal.
-Dominó,
ganhei! -gritavas saboreando exuberantemente o doce prazer da vitória; e
explicavas modestamente: -para se ganhar é preciso juntar as frutas certas, não
esquecendo as repetidas...
-Meninos!
-gritava a minha mãe; não, creio que era a tua -sentada do banco do fundo da
carruagem -portem-se bem!
Eis
que mais uma gargalhada surgia. Tínhamos acabado de efetuar uma travessura ao
velhote que seguia no banco à nossa frente dormindo como uma pedra.
Essa
foi talvez a mais bela viagem da minha vida. Porquê?!... Porque era criança e
essencialmente porque tu lá estavas!»
Foi
com este olhar juvenil que então vira o primeiro encontro.
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Autor:
Carlos Silva
Data: Desconhecida
Imagem: Internet
Obs:
Direitos reservados.
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