2023-11-08

0384. Pai

 


Pai

 

É quando estou assim perdido sobre a tua lápide

Devastado perante toda a indiferença da realidade

Assolado pelo silêncio e inércia da tua imagem

Esmagado pela implacável frieza desta breve passagem

 

É quando estou aqui, tão próximo e tão distante de ti

Que em mim afloram instantes que contigo vivi

Que mais sinto a falta dos teus traços e laços

Que mais sinto a falta dos teus beijos e abraços

 

É quando estou assim, observando-te sem te poder ver

Quando te tenho dentro de mim sem te poder ter

Quando perdido neste vazio que ninguém pode preencher

Quando mergulhado nestas lágrimas que ninguém pode suster

 

Que mais sinto a tua falta

Que mais queria voltar a abraçar-te

Que mais queria voltar a beijar-te

Que mais queria voltar apenas a chamar-te

 

Pai

 

 

Autor: Carlos Silva
Data: 2022-05-20
Imagem: Pai
Obs.:
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2023-11-06

0383. Ficção religiosa

 


Quando abres um dos mais primitivos livros da humanidade e constatas que a personagem principal, apresentada de forma fictícia e com poderes sobrenaturais, é “ciumenta e orgulhosa, controladora e mesquinha, injusta e intransigente, genocida e vingativa, sedenta de sangue, perseguidora, homofóbica, racista, infanticida, filicida, pestilenta, megalomaníaca, sadomasoquista, malévola... [1]

Quando constatas que contém inúmeros factos científicos que são comprovadamente falsos, com “grotescos erros de Geografia, Botânica, Biologia, Zoologia e Astronomia…[2]

Quando constatas que no livro são descritos fenómenos extraordinários que nunca ninguém observou, “animais que não existem, personalidades e factos que historicamente nunca existiram, profecias que nunca vieram a acontecer, contradições e versões divergentes, inúmeros absurdos e exageros...[3]

Quando constatas que contém “torturas, apedrejamentos, enforcamentos, empalamentos e outras crueldades, escravatura, racismo, xenofobia, homofobia, misoginia, incesto, prostituição, adultério, poligamia…[4]

Quando constatas que contém “cobiças, ciúmes, traições, ódios, genocídios, guerras, assassinatos de crianças e de outras pessoas inocentes, discriminações sociais, grandes injustiças económicas, seres humanos queimados em fogueira…[5]

Quando constatas que inspirou inquisidores, criou instrumentos de tortura, masmorras, prisões, correntes que rasgavam e mutilavam carne humana de supostos pecadores, produzindo sofrimentos horrendos e atrozes…

Quando constatas que grande parte de todo o horror nele descrito foi realmente executado em nome duma hedionda personagem principal, criada maquiavelicamente pelo próprio homem com o vil propósito de dominar e amedrontar o seu semelhante…

Quando constatas que essa personagem omnisciente, omnipotente e omnipresente, é apresentada como criador da humanidade e de toda a biodiversidade, da terra e do universo, num espaço de tempo relativamente curto e depois não faria absolutamente mais nada…

Quando constatas todo o ódio que semeou e semeia entre famílias, povos e nações, alimentando guerras, fome, pobreza e desgraça…

Quando constatas que, ainda hoje, metade do mundo continua a afirmar e a doutrinar a outra metade no sentido que todo o mundo acredite piamente que o conteúdo desse livro é de inspiração divina, realmente autêntico, e que se deve continuar a fazer rigorosamente o que nele se descreve…

Quando constatas os seres humanos que foram perseguidos, presos e condenados à morte apenas por discordarem ou questionarem esse livro…

 

Quando finalmente tens a liberdade, o direito e o privilégio de pensar e constatar todo o sofrimento que a humanidade já padeceu e continua a padecer em nome desse livro…

Quando finalmente és livre de pensar e escolher o que realmente queres e desejas ler…

Quando finalmente sentes que não podes ficar calado nem parado perante toda esta insanidade mental…

Quando finalmente a tua mente sente que uma palavra… um gesto… um grito de revolta… pode salvar uma vida… muitas vidas…

 

Então não podes ficar parado…

É urgente escrever… é urgente agir e gritar bem alto até que a voz te doa:

 

Desperta Humanidade!

 

Autor: Carlos Silva
Data: 2022-12-17
Imagem: Internet
Obs.:
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[1] Richard Dawkins

[2] Victor Correia

[3] Idem

[4] Idem

[5] Idem


2023-11-03

0382. Clareza I

 



Tão clara é a clareza da minha natureza

Como clara é a clareza da minha certeza

Tão clara é a clareza da minha natureza

Como clara é a clareza da minha fraqueza

 

Tão clara é a clareza da minha imperfeição

Como clara é a clareza da minha desilusão

Tão clara é a clareza da minha ilusão

Como clara é a clareza da minha razão

 

Tão clara é a clareza da minha razão

Como clara é a clareza da minha inquietação

Como clara é a clareza da sua transformação

 

Tão clara é a clareza da minha natureza

Como clara é a clareza da minha clareza

Como claro é o Fim e a clareza da certeza


Autor: Carlos Silva
Data: 2023-02-08
Imagem: Internet
Obs.:
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2023-10-28

0381. Gaiola

 


Quem nasce e cresce na gaiola da sua mente

Dificilmente soltará asas e voará plenamente

Facilmente regressará ao conforto da sua gaiola

Facilmente regressará ao consolo da sua esmola

 

Regressará sempre ao conforto e afeto espiritual

Regressará sempre ao confronto do bem e do mal

Regressará sempre ao paraíso e ao inferno carnal

Regressará sempre à ilusão da sua gaiola mental

 

Não existe maior prisão que a ilusão da liberdade

Não existe maior prisão que a proscrição da verdade

Não existe maior prisão que a negação da realidade

 

Não existe pior prisão que a ilusão da liberdade

Uma mente cega e incapaz de voar plenamente

Uma mente cega e incapaz de amar completamente


Autor: Carlos Silva
Data: 2023-03-01
Imagem: Internet
Obs.:
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2023-10-27

0380. Crenças

 


Estima-se que existam cerca de 10 mil cultos religiosos ou formas de crença popular que, ciclicamente, se têm reiterado e reinventado ao longo de civilizações e gerações; a maior parte deles com mandamentos completamente primitivos e absurdos para o contexto social atual.

Em pleno século XXI, eventualmente no seu derradeiro ciclo, ainda é possível observar seres humanos a dialogar com paredes e estátuas e a repetir até à exaustão, lengalengas de livros supostamente sagrados, como forma de agradecimento a amigos imaginários precocemente incutidos como criadores, salvadores e guardiões de pessoas e templos.

Culturalmente tidos como virtudes e incontestáveis espelhos de verdade, gravaram a sangue, suor e lágrimas, algumas das páginas mais negras da história da humanidade.

Fomentaram ódios, “guerras santas”, cobiças económicas e de poder…

Negaram, contraditaram e amarraram o conhecimento científico…

Aniquilaram o pensamento racional e violaram a inteligência…

Amarraram e aprisionaram a evolução humana…

 

A humanidade não precisa deste passado sombrio que, ao longo de séculos, impiedosamente e impunemente se alimentou da pobreza e desgraça dos mais fracos e inocentes.

A humanidade terá repetido mil vezes o mesmo erro ao longo do tempo e diferentes civilizações… mas alguma vez terá que despertar e perceber que não o pode voltar a repetir.

A globalização, a generalização da informação, o acesso ao conhecimento e sobretudo a melhoria das condições gerais de vida da humanidade, serão certamente fatores indispensáveis à evolução e a este lento despertar para a realidade.

A inteligência não nos permite voltar a errar… 

 

Afinal, a mentira, ainda que mil vezes repetida, jamais poderá ser verdade!

 

Autor: Carlos Silva
Data: 2023-09-05
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Obs.:
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0379. Reparar

 


Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário (“deus”) o protege, mas, se precisar da sua ajuda, ou eventualmente decidir atirar-se do cimo de uma ponte, o mais certo é ir desta para melhor, pois “ele” nada fará para o evitar!

Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário cuida de si, mas, se ficar doente, o mais certo é recorrer a um médico para que este efetue o diagnostico e prescreva os respetivos medicamentos… e só ficará melhor depois de os tomar e efetuar os respetivos tratamentos, pois “ele” não fará absolutamente nada para o ajudar!

Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário orienta o seu futuro, mas, na realidade, para alcançar os seus objetivos tem que estudar ou especializar-se numa determinada área profissional… e “ele” nem sequer mexe uma palha!

Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário o alimenta, mas apenas se você produzir ou trabalhar arduamente para ganhar o seu salário e assim poder colher ou comprar os alimentos que precisa… e até hoje, “ele” nunca fez cair nenhum pão do céu!

Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário lhe oferece tudo o que gosta e precisa… terra, casa, carro… mas, na realidade, para o alcançar, é preciso que trabalhe e lute toda uma vida… e se não o fizer, “ele” também não o fará por você!

Certamente já terá reparado que o seu amigo imaginário lhe concede uma família, amigos e muito amor… mas apenas se você amar alguém e tratar bem todos os que o rodeiam… e não apenas venerar a “sua” imagem mental.

 

Pois é, o seu amigo imaginário não consegue fazer nada sozinho e está sempre dependente de si. Tudo depende exclusivamente de si e da sua ação!

 

Não adianta rezar ao seu amigo imaginário porque não produz nenhum resultado prático ou útil!

Não adianta pedir nada ao seu amigo imaginário porque “ele” ignora-o e não faz rigorosamente nada por si.

 

Portanto…

Se já chegou à conclusão de que tudo depende unicamente do seu esforço e dedicação;

Se finalmente conseguiu questionar a sua existência, sem medo de ameaças ou punições infernais;

Se finalmente considerou ou equacionou a hipótese do seu amigo imaginário apenas existir na sua mente;

Se finalmente concluiu que o que lhe acontece de bom ou mau resulta da sua ação e é essencialmente dela que depende o seu êxito ou fracasso;

 

Tal significa que finalmente é um ser completamente livre!

Tal significa que finalmente despertou completamente para a realidade!

 

Afinal, não existe pior cegueira que a inconsciência da sua abominável prisão mental.

 

Autor: Carlos Silva
Data: 2023-10-25
Imagem: Internet
Obs.:
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